Eu e Jimmy, mais um conto clariceano, conta com ilustrações de José Correia Moura, amigo de Clarice. Moura retrata Jimmy conforme ele é descrevido no texto, mas a imagem de sua namorada ele faz baseada em Clarice Lispector.
Eu e Jimmy centra-se na relação de um jovem casal. A narração em primeira pessoa é feita pela mulher que, ao buscar uma identidade, analisa seu comportomento frente aos homens. A jovem narradora se sente perturbada com a aproximação de Jimmy, para quem bastava que duas pessoas se gostassem para se entregarem ao amor. Apesar disto, ela cede ao fascínio que Jimmy lhe desperta.
Toques de leveza e de bom humor transparecem em meio à crítica sutil da subserviência das mulheres em seus relacionamentos afetivos. Em certo momento, a narradora se desculpa: "Que podia eu fazer, afinal? Desde pequena tinha visto e sentido a predominância das idéias dos homens sobre a das mulheres." E fala, então, sobre sua mãe:
"Mamãe antes de casar, segundo tia Emília, era um foguete, uma ruiva tempestuosa com pensamentos próprios sobre liberdade e igualdade das mulheres. O mal foi a coincidência da matéria. Houve um choque. E hoje mamãe cose e borda e canta ao piano e faz bolinhos aos sábados, tudo pontuamente com alegria."
E ainda acrescenta: "Tem idéias próprias, ainda, mas se resumem numa: a mulher deve sempre seguir o marido, como a parte acessória segue o essencial." Sobre o amor, a narradora estava apenas começando a conhecê-lo, principalmente pelo impacto da figura de um de seus professores que a leva a confessar o esforço enorme que fazia para não fechar os olhos e morrer de alegria, sem conflitos íntimos. "Era eu então absolutamente feliz. Quanto a Jimmy, continuava despenteado e com o mesmo sorriso."
Clarice cursa nesta época o curso de Direito e se perde algumas vezes, passando para os leitores o conhecimento que acabava de adquirir na faculdade. É o que ela faz, por exemplo, nesta parte onde a narradora termina o namoro com Jimmy usando Hegel:
"Disse-lhe que o primitivo equilíbrio tinha-se rompido e formara-se um novo, com outra base. É inútil dizer que Jimmy não entendeu nada, porque Hegel era mais um ponto no fim do programa e nós nunca chegamos até lá. Expliquei-lhe então que estava apaixonadíssima por D... e, numa maravilhosa inspiração (lamentei que o examinador não me ouvisse), disse-lhe que, se caso, eu não poderia unir os contraditórios, fazendo a síntese hegeliana, inútil a digressão."
A moça acreditava que Jimmy não se importaria, já que para ele a teoria vigente era a de que os homens deveriam dar vazão aos sentimentos, livrando-se da filosofia, assim como fazem os animais. "Tudo deve ser muito simples", ele dizia, "sem conflitos morais e sem complicações impostas pela civilização." E foi aproveitando deste discurso que a narradora termina o relacionamento com Jimmy, mas, para sua surpresa, resultou em uma reação tempestuosa do garoto, que a chamou até mesmo de "borboleta".
Preocupada, a moça busca os conselhos da avó, de quem ouve que os homens constroem teorias para si e outras para as mulheres, concluindo: "Minha querida, os homens são uns animais."
No fim do conto, irônica, ela diz:
"Voltávamos, assim, ao ponto de partida? Não achei que esse fosse um argumento, mas consolei-me um pouco. Dormi meio triste. Mas acordei feliz, puramente animal. Quando abri as janelas do quarto e olhei o jardim fresco e calmo aos primeiros fios de sol, tive a certeza de que não há mesmo nada a fazer senão viver. Só continuava a me intrigar a mudança de Jimmy. A teoria é tão boa!"